terça-feira, 13 de junho de 2023

Hoje

 Hoje eu passei por uma experiência interessante. A caminho do trabalho cruzei meu olhar com o de um estranho (coisa que eu dou o máximo tentando evitar), por coincidência, a música do meu fone estava trocando de faixa e eu ouvi um "Muito bonita", assim, simples assim, sem sinal de abuso, de assédio, só admiração (coisa que posso estar bem enganada), enfim. Esse tipo de situação me acontecia muito da pré-adolescência para a adolescência. Assédio por todos os lados, eu não tinha um segundo de paz andando sozinha pelas ruas do centro de São Paulo, homens que trabalhavam na região, de todas as idades e de vários estados diferentes (25 de março, né), não foi fácil crescer sendo assediada a quase quatro passos. Isso me trouxe uma recordação dos abusos que eu sofria dentro de casa, como eu era tratada literalmente como um nada, um ninguém., eu não podia permanecer no mesmo ambiente que o meu pai, se eu estivesse na sala e ele entrasse, eu imediatamente tinha que me levantar e sair. Ele foi muito claro quanto a essas exigências, eu não devia sequer levantar a cabeça e olhar para ele, a sensação que eu tive ainda que não tenha sido dito em palavras, era de que ele me desprezava, como se eu fosse o ser humano mais vil e imundo da face da terra, coisa que eu acreditei durante muito tempo, quando eu era só uma menina que não sabia como se defender da violência de quem supostamente deveria me amar.

Tento me livrar até hoje das cicatrizes que todos os abusos que eu sofri deixaram em mim, talvez esse seja o meu lado mais bonito, quem sabe? Eu acabei criando uma certa empatia pelas pessoas, empatia essa que a maioria sequer merece, por vezes me sentia uma otária por ser tão "boazinha", até que passei a não ser mais e aí, eu virei a escrota... Por incrível que pareça essa é uma das coisas das quais eu me arrependo, não pelos outros, mas por mim. Eu lutei tentando me encaixar em um mundo que eu deveria ter desprezado, tudo para não sentir, para não ficar sozinha. Eu precisava de distrações constantes, sentir era demais para mim. Me sinto hoje a pessoa que é capaz de derrubar uma porta com um chute, mas que não o faz simplesmente por não haver motivos para isso. Não me sinto nem esgotada, só descobri que não vale mesmo o esforço

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